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terça-feira, fevereiro 01, 2011

Discussão de Mesa: Respeito, manolo!


Zuera é bom e todos gostam. Como um grupo majoritariamente de homens (e o Artur), nosso tratamento pessoal é sempre na base da palhaçada, sempre um xingando o outro, se batendo; enfim, somos "das caverna", e é divertido.

Não há problema algum nisso. Quero dizer, às vezes a gente exagera, e o Carlão sai chorando, mas... Tá, desculpa, Carlão. Não vai acontecer de novo.

No final das contas, nos tratamos respeitosamente com falta de respeito generalizada. Isso é massa enquanto estamos de boa, assistindo um filme, jogando alguma coisa eletrônica... Mas é um pé no saco na mesa de RPG.

Na mesa interpretamos personagens fantásticos: investimos uma quantidade substancial de esforço e tempo para que ele seja extraordinário. Nuances na história, tiques, maneiras de falar, aparência. Nos emprestamos muito aos nossos personagens; por isso é um pé no saco quando os outros jogadores menosprezam essas criações - desde a zueira normal à criação de apelidos patéticos, ridicularizando os esforços dos jogadores em serem heróis; nós esquecemos de que os outros caras na mesa também tiveram o mesmo esforço ou mais, para poder jogar e se divertir com seus personagens, e, embora zoar possa ser divertido até certo ponto, uma hora você simplesmente perde o tesão no esquema. RPG já é um jogo em que as pessoas precisam de um esforço mental homérico para se manter ali, e ridicularizar a imaginação de outra pessoa pode ser a gota final pra pessoa parar de jogar.

Vocês sabem do que eu estou falando... É o caso do cara tentando fazer um discurso legal antes de entrar na dungeon e um outro jogador interromper pra perguntar algo imbecil, ou um cara estar passando as estratégias pra agir no campo de batalha e metade da mesa estar conversando em off, cagando para o amigo. É o mestre estar descrevendo alguma coisa complexa, imprimindo esforço mental naquilo para se tornar algo envolvente, e o filadaputa cortar a descrição para falar alguma merda sem valor.



Nunca paramos para ver o personagem dos nossos amigos ao lado. Estou errado? Nunca paramos para apreciar o trabalho que outra pessoa teve ao criar algo. Nunca elogiamos o esforço das pessoas. Então o Lorde Anão, senhor de muitas terras sob as montanhas sempre será "O Anão" do grupo. O Elfo fugitivo das pragas do Leste sempre vai ser o "orelhudo, viadinho, fresco" do grupo. A história do outro, e a profundidade do caráter de seus personagens - e por tabela, um pedaço desta pessoa - nunca será apreciada. Coisas que fazem a diferença, mas que não parecemos nos importar.

Parte desse pensamento me faz não querer jogar mais RPG; a outra parte me fez escrever essas linhas, tentando compartilhar a experiência e abrir os olhos das pessoas ao redor. 


Pense por um segundo e responda: por que o grupo de personagens mais famosos da história da fantasia medieval se chamava Fellowship ("Relacionamento baseado em amizade") of the Ring? Você consegue pensar em Aragorn diminuindo Gandalf? Consegue pensar em Legolas dizendo à Gimli que ele é um bunda-mole, quando ele tremeu diante do Balrog?

A Sociedade do Anel se respeitava, e por isso desenvolveram impressionantes laços emocionais e afetivos, que deram ainda mais profundidade à história de cada um individualmente, com as ocasionais horas em que víamos as qualidades de um personagem ou de outro; descobrimos que Sam era honrado e companheiro, que Frodo era determinado, que Bilbo gostava de escrever, que Gandalf fazia fogos, que Aragorn pegava a elfa, que Boromir era corruptível, mas conseguiu se reerguer no final.

Agora, será que a gente dá tempo e espaço para as pessoas jogarem na mesa, ao nosso lado?

Será que você dá este espaço aos outros? Permite que eles joguem o jogo também, ou monopolizam a ação, o mestre, os turnos? Você concorda, não concorda? Quer que eu morra ou tem alguma idéia para posts? Manda aqui nos comentários, vamos bater um papo. Não tenha medo, o Extralies não morde. 

8 Falatórios:

Ricks! disse...

Espaço pra jogar, acho que pelo menos com todos que eu joguei, não enfrentei esse problema, entretanto, o que eu acho que ainda persiste é a metodologia de criação de personagens "por números". Sei lá, acho que pelo menos na 3.5 não rolava isso, talvez pela inexistência do Character Builder. Não digo que TODOS façam assim. Até porque tem muita gente que faz o personagem na cabeça antes, pensa nos trejeitos e frescuras, e ai sim vai pra tela do note. Mas também tem os que criam como se fosse um carrinho de compras: "Quero um pouco desse, um pouco desse, vai ser anão, puts essa habilidade dá +15 de viadeza."
É chato? É. Você se inspira totalmente pra incorporar o personagem na interpretação, e vem um que senta ao seu lado só porque o "char" dele tem 18 fodilhões de ataque. É o velho dilema do "Menos off, mais On". Menos números, mais interpretação.

Anônimo disse...

Eu reparei que perdi boa parte do prazer em jogar por decorrecencia desses fatos, não sei se foi por querer ou sem querer mas reparei que os meus personagens já não tem a mesma profundidade de antes na verdade nem busco mais isso pq sei que ele será menosprezado.
Ou pior nunca mais vou jogar com ele então se vou criar um personagem para uma sessão somente e sei que ela será zuada nem busco faze-lo por completo.
O último personagem que fiz e deu pra jogar com tudo o que era de direito assumindo o de vido lugar e os devidos conflitos foi o meu Sith que joguei com o quadrado e o Chico como mestre.

Vergatti disse...

Internet é uma bosta: acabei de responder os comments, mas apagou tudo ¬¬. Well, vamos lá.

Realmente, os fatores que vcs citaram (direta ou indiretamente) influem muito pra criar esse clima de respeito na mesa - que tem muito a ver com todo mundo "estar na mesma página" com relação à proposta da coisa toda. Um desses fatores é a cabeça voltada para os números, que é algo que eu não critico em si; o que me parece é que o jogador (médio) que faz isso perde a complexidade da história, e não percebe que os outros gastaram tempo e esforço naquilo, assim como na interpretação e tudo mais. O outro aspecto "sub" citado é o número de jogadores na mesa: quanto menor, mais "tempo de câmera" todos têm - para desenvolver a história, demonstrar o caráter e interpretar/jogar mesmo; é muito mais fácil controlar os jogadores, no sentido de prevenir bagunça e "cavalismos". Bom, se eu prosseguir mais, vira um post; vou parar por aqui antes disso. 'Té.

Unknown disse...

Eu concordo com o Ricardo, apesar de eu ser meio suspeita pra falar, afinal eu e a 3.5 é um caso de amor antigo. É mto chato vc ter que ver o povo falando pra vc assim: "vc ker fazer um warlock, então tem que fazer um tiefling que ganha isso, mais isso e mais isso". Será que ninguém parou para pensar que é meio estranho pensar assim, tipo por exemplo, será que não existe NENHUM warlock de outra raça ou que os tiefling são uma raça isotrabalhistica....

Fora o exagero de combo.

A falta de proximidade com o personagem.

Aí, vc vai fazer um guerreiro e compra uma lira... já posso até imaginar as caras. O_O"

bjundas

Gustavo disse...

Nossa em relação ao que a Codorna disse um dia eu passei por isso, tinha trocentos jogadores e eu fiz sem querer um personagem que fazia a mesma função que outro só que era diferente.
Tive que tirar ele do jogo pq ele era considerado fraco em rela ção ao outro personagem. =(
Mas ninguem levou em consideração de que ele tava fazendo o serviço dele e ainda por cima foi um dos caras que menos se ferrou na partida.

Vergatti disse...

D&D tem dessas, né? A parada da criação em grupo (que só se parece criação em grupo porque deram esse nome em primeiro lugar), das escolhas de papéis e tals.

Pode ser bom se o grupo souber conversar, senão, já era. Vai ter neguinho (metafórico) reclamando do seu equipamento, reclamando dos seus poderes... Mas na hora que você prova que não é só um saco de XP, ninguém fala nada. Na hora que você mostra que suas escolhas valeram a pena, ninguém fala "legal".

Que tal apreciar o sucesso alheio?

Francisco Ferreira disse...

Melhor post ever do blog!

O que mais gostei de mestrar uma campanha longa foi perceber para que tipo de jogadores eu gosto de mestrar. E mais: consegui amadurecer alguns jogadores que eram bem verdes no início das aventuras.

Nas sessões eu procuro interagir mais com os personagens cujos jogadores gostam de interação. Quem joga comigo sabe que quando eu tento envolver o personagem na trama, e o jogador "caga" pra aquilo, eu largo mão e passo adiante.

Tem sempre alguém que quer viver um personagem. Assim como sempre tem um gaiato que quer ir pra mesa com nenhuma idéia interessante, dar muita risada (a qualquer custo), e depois ir dormir desestressado e com a consciência leve.

Na moral, esses últimos eu tento cada vez mais manter afastados da minha mesa. Cansei de ver boas idéias sendo jogadas fora a troco de uma piada nem tão engraçada.

Abraços!

Vergatti disse...

@Chico: Pô, obrigado pelo elogio, de verdade.

E é isso mesmo, né? Mestre se esforça na criação de toda a realidade ao redor, e sempre é um pé no saco ver esforço jogado fora: cansa.

Leva maturidade pra se respeitar os outros, e para aproveitar estórias mais profundas. Abraço!